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quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Diários de Viagem II: Gustavo

“Nós havíamos decolado para Londres havia umas duas horas. Íamos eu, meu marido Gilberto e meu filho Gustavo. O Gustavo não estava bem desde que a Marina terminou o noivado com ele. Lésbica, doutor, imagine só. Faltando só duas semanas para o casamento. Gustavo ficou péssimo, trancou a faculdade, largou o estágio. Foi sério. Precisou de terapia, antidepressivos, uma barra, o senhor nem pode imaginar. Aos poucos foi melhorando, mas ainda não estava legal. Ficou traumatizado, o senhor entende, quem não ficaria? O Bebeto, quero dizer, meu marido Gilberto, sempre me disse que ela tinha alguma coisa errada. A Marina assistia futebol com eles no domingo, um, dois, três jogos seguidos, xingava muito o juiz, essas coisas. Mas enfim, o Gustavo ainda não estava bem. Foi quando eu propus que fizéssemos uma viagenzinha para Londres. A gente teve que insistir muito, mas ele acabou aceitando. Então, depois de servirem e recolherem o jantar a bordo, teve uma turbulenciazinha, aquele aviso de apertar os cintos, a gente já tinha até se acomodado para cochilar. O Gustavo pediu para ir ao banheiro, lá no fundo, atrás de onde nós estávamos. Fiquei atenta, que mãe não ficaria? O Gustavo já estava demorando,  não voltava nunca, e eu falei ‘Bebeto...’ (meu marido, Gilberto), ‘...Bebeto, o Gugu está demorando, vai lá ver se ele está bem’. Bebeto é muito descansado, doutor, já estava até cochilando. Aí já tinham passado uns dez minutos e o Gugu não voltava. Levantei e fui lá para trás. A porta do toalete estava trancada. Eu chamei baixinho: ‘Gustavo’. Ninguém respondeu. Chamei de novo: ‘Gustavo’. Nada. Aí, doutor, pensei um monte de besteira, que ele tinha tido uma recaída, sei lá. Comecei a bater na porta e gritar: ‘Gustavo! Gustavo, abre a porta!’, e nada, doutor. Entrei em pânico, comecei a esmurrar a porta do toalete e gritar pelo meu filho que nem uma doida. Veio um comissário, veio uma aeromoça, e o Bebeto lá, dormindo...”

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“Eu sou médico, doutor. Cardiologista. Sabe como é, muitas pacientes velhinhas. Acho que elas me acham magro, pois vivem me dando docinhos, compotas, balinhas, essas coisas. Então, uma paciente, Dona Lourdes, tinha me dado um pote de doce de jenipapo, que ela tem um pé no quintal de casa. Eu nunca tinha comido doce de jenipapo. Licor eu já tinha ouvido falar, mas doce não. O senhor conhece? Não? O cheiro é bem ativo, minha mulher até achou o cheiro ruim, nem quis provar. Mas estava gostoso, o danado. Todo dia eu comia um pouquinho. Aí chegou o dia da viajem e ainda tinha uma boa quantidade do doce no pote. Almoçamos em casa mais cedo, antes de sairmos para o aeroporto. Como nós íamos ficar fora uns vinte dias, eu fiquei com pena de jogar o resto do doce fora, e comi tudo. Loucura, não é não, doutor? Tudo para dar errado. Já no aeroporto eu comecei a me sentir esquisito, mas achei que era ansiedade. Eu tenho um certo receio de avião, o senhor sabe como é. Cheguei a comentar com minha mulher: ‘Benhê, eu não estou legal’. Mas depois melhorei. Tanto que, já no avião, jantei bem. Me esqueci de tudo, tomei até vinho, só uma tacinha. Recolheram as coisas e a gente se acomodou para dormir. Acho que até peguei no sono. Aí veio a turbulência. Danou-se. Comecei a suar frio. Chamei minha mulher e falei: ‘Eu não estou bem’. Procurei aflito o saquinho no bolso da poltrona da frente e não tinha, nem na minha nem na dela. A coisa estava periclitante. No desespero, rasguei o saco plástico da manta, arranquei ela de dentro e foi a conta, doutor. Graças, pois não pingou nada fora. Minha mulher chamou a aeromoça, que trouxe correndo umas toalhinhas molhadas, mas aí a emergência já era mais ao sul, se é que o senhor me entende. Levantei-me rápido, que o passageiro do corredor a essa altura já estava de pé havia muito tempo, e corri para o toalete dos fundos, sem saber que extremidade do tubo digestivo eu iria por no vaso. Acabei sentando, e fiquei ali, quietinho, pensando que poderia ter sido bem pior. Falei comigo mesmo: ‘Só saio daqui quando estiver tudo em paz comigo’. Relaxei e comecei a ler aquelas plaquinhas todas, já treinando o meu inglês para quando chegássemos em Londres. Tem um monte delas no toalete, o senhor já reparou? Só quando a gente está sem pressa é que repara nelas todas, valem por um curso de inglês. Aí uma mulher louca começou a esmurrar a porta e a chamar um tal de Gustavo. Pensei: ‘Ela vai acabar vendo que ninguém abre a porta, ou então o Gustavo aparece, e aí ela desiste’. Mas ela não desistia, doutor, dava socos na porta, uma gritaria dos diabos lá fora. Então eu decidi abrir só uma frestinha e dizer para ela que eu não era o Gustavo, mas aí escancararam a porta e me pegaram sentado com as calças nos pés. Não tive a intenção, doutor, juro. Está aí fora o Gustavo, que não me deixa mentir. Aliás, gente finíssima, o rapaz.”

4 comentários:

  1. Afinal, onde estava o Gustavo?????
    Por acaso, estava no compartimento de bagagens do avião, numa tentativa de plagiar a psicóloga que, dias antes (ou depois, sei lá), foi encontrada no porta malas de um veículo no prédio em que mora, no Rio de Janeiro????
    Fica a dúvida: Gustavo, onde você se meteu, durante aqueles 10 longos minutos em que sua mãe entrou em pânico, rapaz???

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  2. Quem tiver pistas sobre o paradeiro de Gustavo durante aqueles 10 angustiantes minutos, favor encaminhar para esta redação.

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  3. A pergunta que não quer calar:
    - Onde esta Gustavo?
    Quem souber,por favor me avise.

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  4. Teria Gustavo,por causa de um grande amor,dado fim a própria vida???
    Ou será que Gustavo estaria em outro toalete,fazendo sexo selvagem,com aquela comissária loura,de olhos verdes,1.80cm e aquele par de coxas???

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