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quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Budismo, Futebol, Política e Felicidade

Por que tenho e temos opinião formada sobre tantas coisas? Por que somos Flamengo ou Fluminense, PT ou PSDB, gostamos ou não de pagode, rock, música clássica, mulheres louras e magras ou morenas bem fornidas, ou não gostamos de mulher? As preferências pessoais são livres, e é saudável que existam diferenças. Que seria das louras magras se todos preferissem as morenas roliças? Tenho tentado pensar de forma desapaixonada nessas questões. Torço pelo Fluminense, certamente não porque seja o melhor time, mas porque meu avô era Fluminense, e, por causa do meu avô, meu pai também era Fluminense. Se não fossem, eu poderia ser Flamengo ou Vasco. Se torcer por um time fosse algo racional eu hoje torceria para o São Paulo, talvez. Ser homo ou heterossexual, gostar de praia ou montanha, ser extrovertido ou calado é tudo questão de carma. A grande maioria de nossas escolhas é irracional e automática, conseqüência de muitas vidas, nossas ou de outros.

Em assuntos sem maiores conseqüências, como futebol, pouca diferença faz que escolhas fazemos, embora existam muitos que vêem o futebol como assunto seriíssimo, a ponto de provocar ódios e mortes. No Maracanã, quando o Fluminense faz um gol, pulo e comemoro, mas não consigo mais deixar de olhar a torcida adversária calada e triste. Inversamente, quando levamos um gol e a torcida adversária comemora, penso que toda aquela gente também merece alegria. Da perspectiva de alguém lá do alto, de Google Earth, como diz minha amiga Karla, talvez fosse mais justo a torcida do Flamengo, mais numerosa, comemorar. Embora continue gostando muito de futebol, torcer nunca mais será o mesmo para mim.

Perigoso é quando pensamos que nossas escolhas são as únicas certas e passamos a hostilizar quem é diferente, pensa diferente ou apenas nasceu em um lugar diferente. Somos iguais em um aspecto fundamental, o desejo de sermos felizes, e, mais que isso, o direito à felicidade. O traficante pensa que sua atividade é um atalho para a felicidade. Que a polícia ou quadrilha adversária querem bloquear seu caminho até lá, justificando assassinatos. Quando alguém resiste a entregar seu carro ou sua bolsa a um ladrão, está perigosamente resistindo a entregar o que, para ele, parece ser a passagem para a felicidade. Da mesma forma, a vítima do assalto não quer que alguém leve embora a felicidade armazenada na bolsa ou no valor do carro. O corrupto quer alcançar uma casa na praia, um carrão, belas mulheres, sensação de poder, alguns milhões em um paraíso fiscal, qualquer coisa que abafe a angústia de se sentir miserável e infeliz a cada manhã. O argentino que quer ser campeão mundial, o colega de trabalho que disputa conosco uma promoção, o motorista do outro carro que disputa conosco uma vaga no shopping lotado, o chefe que parece nos exigir mais do que podemos ou queremos dar, todos tentam fugir da infelicidade.

Porém, qualquer idéia de sucesso que passe pela dor alheia é ilusória. Se buscássemos matar a sede de felicidade na fonte correta, se víssemos com clareza e caminhássemos na direção correta, caminharíamos todos na mesma direção, cada um a seu modo, e não haveria disputas. Quando alguém ergue a cabeça acima da manada, do ponto de vista do Google Earth ou mais alto ainda, e vê além da ignorância, não há mais separação. Nada que antes dividia faz mais sentido. Só faz sentido o que é bom para o todo.

Seria bom se, cada vez que eu encontrasse resistência ou ouvisse uma opinião diferente da minha, eu pensasse nisso. Creio que a bússola está dentro de nós, indicando o Norte. No silêncio podemos ouvir a parte de nós que é anterior à ignorância, que escuta além do ruído, e vê além dos obstáculos.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O Samba do Eleitor Doido

Dilma ou Serra, um dos dois, é um grande mentiroso. Porque um diz que é o máximo, e que a outra não presta, ou será que é o contrário? Pior é se os dois estiverem certos. Qualquer um dos dois vai fazer tudo que não foi feito até aqui pelo Brasil e pelos brasileiros nos próximos quatro anos. Só não sei por quê que os partidos deles não fizeram antes. Acho que eles estavam guardando as boas surpresas pro fim. Só tenho medo do que vem depois do fim. Eu sei mais é que vou torcer pelo meu candidato até o final do campeonato. Que o Flamengo foi campeão ano passado, e ninguém esperava, chato é que depois disseram umas coisas do goleiro, que tá até preso, que eu não sei se aquela vadia está mesmo morta, que dizem que ela era, eu mesmo não sei, ou se é tudo armação. Mas ele defendia muitos pênaltis, e o Flamengo foi campeão, então foi legal. Se ele, meu candidato, está na frente, vou torcer para o jogo acabar logo. Se ele estiver atrás, vou torcer que ele vire o jogo, pois prorrogação ele já conseguiu. Também acho que se ele ou ela perderem, não vai ser assim tão ruim, porque ele está prometendo fazer as mesmas coisas que ela, e ela vai fazer as mesmas coisas que ele, então, se eles não estão mentindo, que eu quero acreditar que não estão, vai dar no mesmo e vai ser bom pra diacho. Vai ter hospital aqui na porta mesmo, com tomografia, mamografia, cintigrafia, serigrafia e pornografia, água gelada e enfermeiras bonitas. Meu filho caçula vai ter duas professoras na sala de aula. Vai ser bom, pois assim ele vai ter uma sala de aula. E meu mais velho vai poder estudar em escola técnica pra aprender a tirar petróleo do pré-sal, que é nosso e ninguém tasca, eu vi primeiro, e vai ter metrô daqui do sertão até o Maracanã, pra eu assistir a Olimpíada e Copa do Mundo, isso se eu não estiver a fim de ver tudo pela banda larga, que dizem que é mais larga que a da mulher melancia, e que por ela passa tudo muito, muito rápido, tão rápido que eu vou ter que aprender a ler de carreirinha, mas a Dilma e o Serra já disseram que eu vou aprender, que não vai ter mais analfabeto no Brasil, e aí vai ter até Luz Para Todos preu ligar aquele trem de computador, de marca Genérica mesmo, tanto faz. Só tô com medo que a Dilma, resolva agora botar na cadeia quem já fez aborto, que antes ela não botava, mas agora sei não, que aí eu mais Maria távamos fornicados, mais que os gays, que eu não entendi ainda se vão ou não vão poder casar, que aí é que vai ser mesmo o fim do mundo, que o pastor falou isso, e eu ia pro inferno me juntar ao FHC, que foi o diabo na Terra, mas se ela, a Dilma, me perdoar, eu vou com o Lula pro céu, que ele já vai estar lá no lugar de São Pedro, que também tem barba, e nem vai ficar tão diferente assim. Que no inferno vão estar também o Zé Dirceu, o Sarney, o Collor e a Erenice, isso se não privatizarem o inferno e demitirem eles, mas dizem que não tem perigo não. Mas o Serra é mais feio que a necessidade, e a Dilma parece com a mulher do Tião Bobinho, que apanha dela, mas na missa ela só aparece rindo, mas eu é que sei. Dizem que ela foi presa, a Dilma, e que o Tião Bobinho não devia ter medo de dar queixa. O Bobinho não sabe que essa tal Maria da Penha vai ajudar ele a parar de apanhar dela, não da Dilma, mas da mulher do Tião. Só sei que eu voto em quem a Marina mandar, que eu gostei dela, meio magrelinha, que eu gosto de mais carne, mas ela tá perto de Deus, que eu sei, e ela é direita por que nunca foi presidente, mas se já tivesse sido, sei não, mas ela não foi e é direita. Então, o que ela mandar eu faço, e se ela não mandar, eu não sei o que é que eu faço. O Tião Bobinho diz pra eu parar de ser bobo, que num devia acreditar tanto, mas eu acredito sempre e eu vou votar, que eu sei que vai ser muito bom daqui pra frente.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A Outra


Os garçons começavam a circular as bandejas pelo salão de festas do Clube Caiçaras. Os primeiros convidados a cumprimentar os noivos começavam a ocupar seus lugares à mesa, enquanto o quarteto de cordas preparava-se para executar uma peça barroca. A fila de cumprimentos estendia-se além das portas do salão finamente decorado com flores tropicais, desaparecendo além da vista pelo jardim. Uma brisa fresca, quase fria, vinda da Lagoa Rodrigo de Freitas e, mais além, do mar de Ipanema, entrava pelo salão naquele final de maio.

O noivo, porém, suava. Já por duas vezes Ricardo tirara o lenço de seda da lapela e enxugara as gotas que teimavam em brotar em sua testa. Aquela era para ser uma noite de despreocupada alegria, quando estariam mesclados os amigos e familiares seus e de Flávia que, de agora em diante, passavam a ser uma só família.

Despreocupação, entretanto, era um estado de espírito que Ricardo não freqüentava havia duas semanas, desde quando a faixa aparecera estendida numa manhã de sábado entre um poste e uma árvore, defronte ao hospital de seu pai, no Grajaú. Dizia: “Ricardo: estarei no seu casamento. Assinado: a Outra”.

Na verdade, ele nem chegara a ver a faixa. O velho Dr. Gilberto, seu pai, a mandara arrancar ainda antes das oito da manhã. Por sorte, Dr. Gilberto ainda madrugava no hospital, sete dias por semana. Era unanimidade que seu olho de dono, sempre presente, associado à sua invejável capacidade de manter-se atualizado com os avanços da medicina e da gerência empresarial (ou “business management”, como ele aprendera e gostava de repetir de uns tempos para cá) eram responsáveis pela transformação da pequena clínica obstétrica da zona norte num dos maiores e melhores hospitais do Rio de Janeiro.

Apesar da presteza na intervenção, no Hospital Anchieta não se falou em outra coisa desde então. Convidados indecisos imediatamente decidiram-se por ir ao casório. Os que haviam decidido não ir subitamente corriam a alugar vestidos e a mandar seus melhores ternos para as tinturarias. Quem seria ela, a Outra, que ameaçava roubar a cena e os flashes naquele casamento marcado havia mais de ano?

Chamado pelo pai às explicações, Ricardo garantiu que aquilo não passava de um trote “de muito mau gosto, por sinal” da sua turma de amigos das noitadas de sexta-feira. O velho não achou graça alguma, vai lá que aquilo chega aos ouvidos da Flavinha, que ele gostava tanto, ia ser um desgosto muito grande para ela, mesmo sendo brincadeira, que ela não merecia que aquilo nem de leve pudesse ser motivo de suspeitas de quem quer que fosse.

- Você me garante que é só uma brincadeira de mau gosto, não é, meu filho? Não vá dar esse desgosto a seu pai. Não quero vexames na frente de toda aquela gente.

Claro que era brincadeira, que o velho ficasse tranqüilo, logo ele, um grande gozador.

Dr. Gilberto tinha genuína simpatia por Flávia, a quem já chamava de filha. Entre namoro e noivado já era uma convivência de alguns anos, que resistira bravamente à temporada do filho nos Estados Unidos, o que contrariara muitas previsões não totalmente isentas de inveja mal disfarçada. Mas, além de futura mãe de seus netos, a iminente entrada de Flávia para a família Souza Dias tinha implicações adicionais, que o próprio Dr. Gilberto esquivava-se em trazer para o nível da consciência. A futura nora representava uma injeção de sangue azul em sua descendência, uma chancela aos esforços dele próprio e de seus pais, imigrantes portugueses que deram duro no pequeno negócio de secos e molhados para fazer doutor pelo menos um de seus vários filhos. Pois não há ninguém que faça fortuna na Baixada ou no Subúrbio, por mais bem sucedido, admirado e invejado que venha a ser em sua região de origem, que não tenha mais ou menos vagas dores de cotovelo e sentimentos de inadequação ao transitar entre os esnobes nascidos e criados à beira-mar, nas terras do Leblon, Gávea, Ipanema e Jardim Botânico, no distante e maravilhoso mundo do lado oposto do maciço da Tijuca. Mesmo que muitos deles fossem financeiramente mal das pernas, sempre formavam rodinhas exclusivas nas festas e recepções onde o Dr. Gilberto impusera sua presença desde os dois triênios em que ocupou a presidência do Sindicato dos Hospitais e Clínicas do Rio de Janeiro. O velho médico do Grajaú nunca conseguira livrar-se da desagradável sensação de ser não mais que um intruso tolerado naquele meio.

Em relação ao negócio da família, Dr. Gilberto começava a antever um futuro em que passaria muitas manhãs paparicando os netos, transferindo gradualmente as responsabilidades da administração do hospital para Ricardo, seu filho mais novo. Gustavo, o mais velho, contrariou o desejo do pai e decidiu-se pelo Direito. Já Ricardo, desde os tempos de ginásio, tinha gosto em acompanhar o pai na ronda pelas enfermarias, centro cirúrgico e mesmo pela farmácia e almoxarifado do Hospital Anchieta. Com aprovação do pai, declinou de seguir-lhe a especialidade de ginecologia e obstetrícia, optando por neurocirurgia e especializando-se em intervenções percutâneas, tendo o pai custeado, logo após o término da residência médica, um ano de especialização em Boston.

Ricardo conhecera Flávia ainda na faculdade, ele no último ano, ela ainda no terceiro. Impressionou-o a beleza elegante, os cabelos longos e finos como o de uma criança, que emolduravam um rosto clássico, iluminado por um constante sorriso, como uma Mona Lisa. Flávia era inteligente, tinha senso de humor agudo e raciocínio rápido. Tinha elevado conceito na faculdade, não só pela beleza, como pelo desempenho acadêmico. Muitas vezes ela ouvira conselhos de que ganharia mais como modelo do que como médica. Mas Flávia tinha paixão pela carreira que escolhera. Seu pai e seu avô eram também médicos, ambos conceituados professores universitários.

Hipnotizado por seu magnetismo, Ricardo levou meses cortejando-a e tendo que refinar sua técnica de abordagem que, em função de sua própria beleza física, nunca precisara de grande aperfeiçoamento. Flávia rechaçou seus ataques durante meses, até ceder à insistência e à inegável simpatia de Ricardo. Desde o momento em que passaram a andar juntos, as qualidades de um iluminaram e realçaram as do outro. Tornaram-se o casal mais admirado e comentado na faculdade, nas festas e onde quer que aparecessem juntos. Dizia-se que eram perfeitos um para o outro, e eles próprios acabaram por convencer-se de que esta era uma verdade imposta pelo destino. O noivado não demorou a ser anunciado.

Como é comum entre as personalidades expansivas e seguras de si, Ricardo sentia que a vida de solteiro não cabia ainda inteiramente na dedicação à Flávia. Muitas vezes, e sempre que ela abria mão de festas e eventos noturnos em função do estudo, Ricardo juntava-se a seus amigos de infância e de subúrbio e esticava as noites nos bares da zona norte e da zona oeste. Adorava rodas de samba e de pagode. Era visível que, então, sentia-se em seu ambiente natural, rindo alto, falando o que lhe viesse à cabeça e bebendo cerveja no gargalo. Ali também era a referência dos amigos e o centro das atenções das garotas, entre as quais borboleteava sem demorar-se muito com nenhuma delas.

Foi então que surgiu Simone, a mais bela flor morena das noites do Méier. Simone identificou e decifrou de imediato qual era o jogo de Ricardo e, deliberadamente, esquivou-se de jogar nas regras dele. Equilibrando a atração que sentia por ele e a segurança em seus próprios encantos, estabeleceu um jogo paralelo, no qual era ela quem dava as cartas. Rechaçou-o diversas vezes, surgia e desaparecia como que por mágica, tornando-se, em pouco tempo, uma presença recorrente no imaginário de Ricardo durante a semana. Só quando teve certeza de que não seria apenas mais uma, cedeu às atenções do jovem médico.

Simone, em muitos aspectos, contrastava vivamente com Flávia, cuja existência ela ignorava. Era mais baixa, mais morena, mais roliça e mais desinibida que sua desconhecida rival, mas não menos inteligente ou decidida. Sambava com graça, ria alto e agitava sua cabeleira negra com precisão certeira. Ela e Ricardo passaram a ser vistos juntos com freqüência na noite suburbana, sempre que, como ela acreditava, os plantões e os estudos de Ricardo permitiam. Este, por sua vez, sentia-se autêntico e à vontade ao lado dela. O que ele via, a princípio, apenas como um interlúdio em sua “vida real”, foi ocupando mais e mais seus pensamentos. Entre quatro paredes Simone era tão desinibida e espontânea quanto em público, enfeitiçando aos poucos seu par. Ricardo cogitou seriamente romper com Flávia, mas não teve coragem de desviar-se de uma rota perfeitamente traçada rumo a uma posição de destaque social e profissional. Depois de muito sofrer intimamente, tomou coragem e expôs à Simone sua vida dupla e seu casamento para dali a poucos meses.

Simone, como esperado, não teve nenhum “fair play”. Chorou, gritou, agrediu verbal e fisicamente o namorado que lhe escapava por entre os dedos e as pernas. Expôs sem pudor seu sofrimento e humilhação, mas foi incapaz de fazê-lo voltar atrás. Ricardo, por sua vez, também sofria. Intimamente invejava a total e vulnerável entrega de Simone àquela paixão, enquanto ele, por mais que gostasse dela, nunca se doara por inteiro. Nisso, respeitava-a e sabia-a um caráter melhor e superior.

Não podendo nem querendo prolongar aquele rompimento, afastou-se do Méier, dos amigos de infância e mudou o número do celular. Tratou de dedicar-se mais à Flávia, num misto de alívio e auto-censura.

Passaram-se meses e, duas semanas antes do casamento, aquela faixa, como que um fantasma suburbano a assombrá-lo novamente.

x.x.x.x.x.x.x.x.

A fila de cumprimentos estava quase no fim. Simone não aparecera na igreja e, agora, parecia pouco provável que ultrapasse os seguranças à entrada do clube e surgisse na recepção. Sentindo que aos poucos a ansiedade esvaía-se, Ricardo gradualmente voltou a sorrir com espontaneidade, circulando entre as mesas com a noiva lindíssima e posando para fotografias que em breve estariam estampadas nas colunas sociais.

Foi quando Gustavo, seu irmão, puxou-o pelo braço para um lado mais tranqüilo do clube.

- Quero lhe apresentar minha namorada. Ricardo, esta é Simone.

Um sorriso alvo abriu-se como um colar de pérolas em meio ao belo rosto moreno, emoldurado por cabelos negros parcialmente presos. O vestido era surpreendentemente sóbrio, verde-água, com sapatos na mesma cor.

- Muito prazer, Ricardo. Seu irmão fala muito bem de você.

Atordoado mais do que temeroso, Ricardo gaguejou:

- O prazer é meu.

Gustavo passou o braço pela cintura fina de Simone e beijou-lhe os cabelos.

- Estou apaixonado por esta morena. Já combinei com papai que, assim que você e Flávia voltarem da viagem, vamos todos passar o fim-de-semana na casa de Araras. Assim, vamos poder nos conhecer melhor.

- Vai ser ótimo. Agora tenho que voltar, a Flávia ficou sozinha com os convidados.

- Parabéns, Ricardo, sua noiva é belíssima, disse Simone. Parece uma modelo, tão alta, tão bonita. Vocês formam um lindo casal.

- Obrigado, disse Ricardo, dando um passo atrás, tentando desvencilhar-se da situação.

- Me dê um abraço. Quem sabe não serei sua cunhada? Simone olhou para trás, para certificar-se do sorriso de concordância de Gustavo.

Ela, então, abraçou Ricardo, apertando-o contra o peito por alguns segundos, enquanto segredava-lhe ao ouvido:

- Quando avisei que estaria no seu casamento, não estava falando apenas da cerimônia.

Ricardo afastou-se lívido, em meio a um turbilhão de emoções. Entre elas, pode identificar um concreto e crescente sentimento de excitação. Teve, então, certeza de que era um completo canalha.