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domingo, 1 de janeiro de 2012

Além do Country Club


Pois é. Aqui em Rio Bonito de Cima tem dessas ambivalências. A primeira vez que viemos, antes de comprarmos o sítio, ficamos hospedados na Cabritinha Vadia, improvável pub irlandês com meia dúzia de quartos por cima, encravado aqui nessa roça esquecida pelo diabo. Na época, ainda era do Ulf, o sueco, e da Regina, Deus a tenha. Depois do jantar,  um prato delicado e delicioso - frango ao molho de limão, filé ao molho de pimenta verde, goulasch ou outra delícia - sempre aparecia gente interessante para conversar e bebericar. “Tem três populações aqui”, ensinava o Ulf, “os passantes, os hóspedes e o country club, donos de sítios.” Na época, éramos da segunda categoria, e há nove anos somos da terceira.

Pois então, depois do jantar, lareira acesa, no aconchego de sofás de molas e de gravuras botânicas e do folclore sueco penduradas no madeirame rústico das colunas, o country club se revelou simpático e sofisticado. Parecia-me que eram todos habituées da Europa, muitos com períodos de residência no velho mundo. Eu, para não fazer feio, me esforçando na minha cultura geral de segunda mão para participar da conversa. Veja bem, não me pareceu que ninguém fosse esnobe, era cada um falando de suas experiências, não tinha cabimento omitir suas Londres, Paris e Vienas do assunto se eram essas suas vivências, enquanto as minhas praticamente se resumiam a Niterói e uma ida longínqua a Nova York. Se disserem que também estive em Assunção do Paraguai eu nego. Ano passado fomos pela primeira vez à Europa, França e Inglaterra, e na ocasião não me eximi de pensar: “Na próxima vou poder falar como chic e não ficar atrás”, vê se pode?

Só não me falaram que tem também a quarta categoria, a mais numerosa: são os da terra, nascidos e criados, os minhocas de Rio Bonito de Cima. Um Guerra e Paz completo de personagens, dramas e histórias, todos interligados por laços de parentesco. Só o Batista, nosso caseiro, tem mais dez irmãos, fora sobrinhos, tios, cunhados, primos e compadres, que abrangem quase toda a população do lugar, umas trezentas almas em busca da salvação, reunidas em torno da simpática igrejinha católica. Tem o Niltinho, que toca a venda na curva do rio, a Ângela, cozinheira e dona do restaurante de comidinha caseira nota dez. A Madalena, que tem o comércio misto de bar, venda e point da juventude local, que chega às noites de sábado a pé, de moto ou a cavalo para jogar sinuca, ouvir música sertaneja, ver e ser visto pelos solteiros do sexo oposto. Tem o Justino, motorista do caminhão da Prefeitura, o Dr. Armandinho, que resolveu a pendência de inventário de nosso sítio, o Leir, o Manezinho Bora, o Biscoitinho, o João Bobinho, a Magalona, o Zequinha, o Hercílio... Nosso sítio fica nas franjas do arraial e, ao contrário da maioria dos outros sitiantes, vamos a pé almoçar na Ângela e fazer compras no Niltinho ou na Madalena, o que nos proporciona muitos bons-dias e boas-tardes, um dedo de prosa aqui, outro acolá. Fora as consultas médicas em troca de muito-obrigado, dúzia de ovo caipira ou queijinho caseiro. Acaba que temos muito mais contato com esse Rio Bonito de Cima que com o outro. Já fomos até convidados para casamento da filha da Magalona com o filho do Justino, quanta honra, fora as comemorações de Nossa Senhora de Nazaré na igrejinha. Dois Rios Bonitos de Cima que pouco se misturam, bem Brasil.

7 comentários:

  1. Só gente boa.....Será merecimento????????????

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  2. Mas, o bom mesmo deve ser conhecer os dois Rios Bonitos de Cima e, como só vocês sabem, conviver com as 4 categorias com maestria, né?! ;-)

    Muito bom texto, gostoso de ler...

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  3. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

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  4. É isso Doctor esse lugar é esse mundo de gente boa
    Mario

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  5. Muito bom o artigo Ralph. Espero poder visitar um dia desses.
    Abraco & Feliz Ano Novo,
    Marcus

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    Respostas
    1. Às ordens. Avisa antes pr'eu coar um café e fazer uma broa.

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  6. Legal, vivi em um lugar assim por 3 anos, primeiro como turista, depois como popular, foi muito bom
    Adoro lugares pequenos exatamente pela companhia que voce tem a todo tempo e a qualidade do afeto
    feliciadades, seus textos sao otimos
    Eu tb escrevo as vezes faz tempo q nao posto, mas se quiser
    http://ef.scaravelli.zip.net

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