Saíra-militar (clique nas fotos para ampliar) |
Minha tradicional SSS - semana
sabática na serra - ficou reduzida a cinco dias este ano, por conta da
perspectiva de uma viagem de duas semanas em setembro próximo. Hay que
capitalizar-se... Munido de equipamento de fotografia, artigos
medico-científicos, material de aquarela e alguns livros, subi a montanha em
direção ao nosso sítio na última quarta-feira. Minha mulher só subiria na sexta
à noite, depois do trabalho. “Alguém tem que trabalhar nessa casa, afinal”,
diria um amante do lugar comum.
Um dos livros que veio na bagagem
foi, por coincidência, “Como Ficar Sozinho”, de Jonathan Frenzen e já estou nas
últimas páginas. Havia lido um trecho do livro na revista “Piauí” dedicada à
FLIP – Feira Literária Internacional de Parati - e gostei de sua preocupação
explícita em se fazer claro para o leitor médio e também pelo seu amor à
observação de pássaros. Entrevistado recentemente a caminho de Parati, Frenzen tinha a expectativa de poder se entregar, um pouco que fosse, à observação nossa fauna
ornitológica. Espero que tenha conseguido. Estabelecidas essas empatias, entrei
semana passada na livraria Gutenberg, em Icaraí, atrás de um de seus livros.
Acabei levando dois: além do “Como Ficar Sozinho”, o romance “As Correções” me
aguarda na prateleira.
Saí-azul (macho) |
Vissiá |
O livro de Frenzen (”Como Ficar
Sozinho”) é uma coleção de ótimos ensaios sobre os mais variados assuntos,
sempre de um ângulo subjetivo e emocional, sem, no entanto, deixar de lado a
objetividade. Ele percorre assuntos como o mal de Alzheimer, que vitimou seu
pai, o crescimento econômico chinês e como ele vem atingindo em cheio as
reservas naturais e a vida selvagem, o sistema prisional americano e diversos
outros temas. Para cada ensaio, Frenzen se envolve pessoalmente com
protagonistas reais, deslocando-se local onde a ação se desenvolve.
Independente de seus conceitos antecipados (pré-conceitos) em cada assunto, ele
acaba por descobrir no palco de cada tema, personagens reais tentando, cada um
à sua maneira, fazer a coisa certa, mesmo nos extremos opostos de cada disputa.
Frenzen nunca consegue chegar a conclusões panfletárias, acaba ficando em algum
lugar no meio do caminho, atolado e emocionalmente envolvido nos aspectos
humanos dos protagonistas.
Num de seus ensaios, Frenzen
reflete sobre sua decisão de se tornar escritor, num mundo onde a grande
maioria das pessoas parece não ter interesse em dispor de seu escasso e
precioso tempo para a leitura de romances. Em tempos de TV, internet e cinema,
os livros parecem ter perdido espaço como meio para divulgação de novas idéias
ou denúncia de situações relevantes que já não tenham sido expostas pela mídia
instantânea, que hoje domina a cena. Acredito, no entanto, que nada supera o
livro como instrumento que nos faça mergulhar profundamente nos aspectos da
subjetividade, daquilo que nos faz seres humanos únicos e ao mesmo tempo compartilhantes
de universalidade humana.
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Gaturamo-bandeira |
Conheço muitas pessoas que ficam
apavoradas só de imaginarem-se por cinco ou dez dias longe da Internet, dos
Shopping Centers, do sinal de celular e de tudo o mais que compõe o turbilhão
das grandes cidades, no qual estamos enfiados até o pescoço na maior parte do
tempo. A perspectiva de não ter o tempo constantemente ocupado e a atenção saltando
freneticamente de galho em galho daquilo que chamamos de vida moderna deixa
muita gente com medo de se ver diante de um não-sei-o-quê, que poderia brotar
do fundo de si mesmos.
Eu, por meu lado, preciso
dessa pausa, preciso travar contato com o Sr. Jenessequá., fazer as pazes e travar
amizade com ele. Acreditem: ele é um cara legal. As conversas que tenho com ele
me são essenciais. Ele foi meu único companheiro nesses poucos dias aqui
sozinho. Já o tédio, esse não existe por aqui. Na verdade, volto sempre com uma
ponta de frustração por não ter dado conta de tudo que me havia proposto a
fazer, mas nada que me perturbe. É parte da motivação para próximas vindas à
serra. Aquarela, por exemplo, dançou. Estudei medicina, li bastante e,
principalmente, fotografei muitos pássaros. Flagrei, pela primeira vez, a saíra
militar, o gaturamo bandeira, a fêmea do gaturamo serrador (ou ferro-velho) e o
tié de topete, além de mais quatro espécies que ainda vou identificar with a
little help from my friends do Wiki-Aves. Ornitologicamente falando, a
semana foi perfeita. O Frenzen teria gostado de estar aqui.
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Pesquisa informal: Faço a você as perguntas que sempre
faço aos meus pacientes que flagro lendo um livro na sala de espera de meu consultório:
O que você está lendo atualmente? Quais livros estão aguardando em sua mesinha
de cabeceira? Você lê mais de um livro ao mesmo tempo?
São 03:20 da madruga ! Procurando o sono e para não brigar com a cama, colchões,cobertas e travesseiros, aqui na minha vidinha solitária fiz um assalto a geladeira que rendeu uma maçã e dei uma espiada nessa "insana e maravilhosa" internet... Gostei do que você escreveu e mais ainda das fotos ! Uau ! Lindíssimas fotos ! Abçs
ResponderExcluirEu ia dizer que este seu texto está muito agradável de ler, que ele desce macio como o jazz que estou ouvindo agora, que você sempre se supera como cronista, que invejo esse tanto de livros que você está lendo, mas dei de cara com esta frase: "A perspectiva de não ter o tempo constantemente ocupado e a atenção saltando freneticamente de galho em galho daquilo que chamamos de vida moderna deixa muita gente com medo de se ver diante de um não-sei-o-quê, que poderia brotar do fundo de si mesmos." Silêncio. Je ne sais quoi...... (soa o saxofone, depois o piano, o espelho é inevitável). Fecha o pano.
ResponderExcluirGenial meu amigo,simplesmente adorável!!
ResponderExcluirFaço coro: "nada supera o livro"!!! E o anseio pela minha própria Semana Sabática cresce a cada dia... Agora, com a leitura sobre a sua, agiganta-se!!! Hehehehe...
ResponderExcluirRespondendo à sua pesquisa informal, dificilmente leio mais de um livro ao mesmo tempo. Já aconteceu, nos tempos áureos, mas de um tempo pra cá, não ando dando conta não...
No momento, há muitos deles me aguardando na cabeceira. Resultado do aniversário que passou, recentemente, aliado à generosidade dos amigos que conhecem bem a fanática por livrarias aqui (filio-me ao seu clube, Ralph). Há biografias (Steve Jobs, Gabriel Garcia Marques), empréstimo ("A menina que roubava livros"), Vargas Llosa ("A festa do bode"), políticos ("A história das ideias políticas" e a releitura de "Os donos do poder") etc. Enfim, eu disse que a lista era grande...
O atual é "O Homem que Roubou Portugal", que conta a história de um dos maiores golpes financeiros mundiais (tramado por Alves Reis). A linguagem jornalística me interessa e o enredo está fazendo valer a leitura!
Acresço uma pergunta, que dirijo a você, informal pesquisador: como você faz quando uma leitura não o agrada? Vai até o fim, encarando-a como uma verdadeira missão, ou a interrompe no meio, sem resquícios de culpa? Conte para nós! ;-)
Um abraço, Ralph!