Poucas coisas podem ser tão perniciosas quanto a felicidade. Eu, que tenho vivido sempre a perseguir essa quimera, agora, às vésperas de fechar o balanço de mais um ano, constato aliviado que grande parte daqueles votos de felicidade proclamados com maior ou menor sinceridade falhou miseravelmente. Que alívio!
Imagine alguém que enriqueça, ou, já sendo rico, que alcance toda a riqueza que tenha sido capaz de imaginar. Que tenha o amor e o corpo da mulher mais maravilhosa que possa ter desejado. Que seu time tenha sido campeão estadual, nacional e continental. Que não tenha sofrido nenhuma decepção, nenhuma ofensa, nenhuma dor física ou moral. Que tenha concretizado todos os seus sonhos e fantasias. Fosse eu o infeliz objeto de tanta felicidade, por certo não veria o alvorecer de 2012, pois antes do foguetório e do champanhe meteria uma bala nos miolos.
Pois que felicidade demais amolece o corpo e o caráter, e a insatisfação é a mãe de todas as artes. Imagine amanhecer a cada dia completamente feliz, sem qualquer inquietação, nenhum incômodo no corpo ou na alma. Quem se disporia a sair da cama? Que louco iria pôr a vontade, o engenho e os músculos a funcionar para tentar melhorar o que já é ideal?
Graças ao bom Deus, a Felicidade não me atingiu. Pequenas felicidades sim, algumas se demorando um pouco, outras ariscas como passarinho da mata. Posso me aproximar do ano novo pleno de insatisfações comigo próprio e com o mundo. Então, vou pegar no armário aquelas esperanças amarrotadas, rotas e verdesbotadas, amarrá-las no pescoço e sair na primeira chuva do ano abraçando e beijando meus semelhantes insatisfeitos, desejando um feliz 2012. Mas, no fundo, torcendo que não sejam tão felizes assim, deixando espaço para um 2013 melhor.
E vamos que vamos!