“E
vos é proibido esposardes as mulheres casadas, exceto as escravas que possuís …” *
“E então ele escreveu
o documento do casamento com Aisha quando ela era uma menina de seis anos de
idade, e consumou o casamento quando ela tinha nove anos.” **
“Se um homem se deitar com
outro homem como quem se deita com uma mulher, ambos praticam ato repugnante.
Terão que ser executados, pois merecem a morte.” ***
“Quando um homem tomar
mulher (...) e contra ela divulgar má fama, dizendo: ‘Tomei esta mulher, e me
cheguei a ela, porém não a achei virgem’; Então o pai da moça e sua mãe
tomarão os sinais da virgindade da moça, e levá-los-ão aos anciãos da cidade, à
porta; (...) Se isto for verdadeiro, isto é, que a virgindade não se
achou na moça, então levarão a moça à porta da casa de seu pai, e os
homens da sua cidade a apedrejarão, até que morra.” ****
Estes são textos considerados sagrados e inspirados por Deus.
Que homem, então, se atreveria a contrariar um mandamento divino? Quem os segue
à risca, faz bem aos olhos de Deus e garante seu lugar no paraíso. Assim
acreditam os radicais religiosos.
Para sua informação: os dois primeiros mandamentos foram
copiados do Corão e os dois últimos da Bíblia. Ao autorizar a escravidão e ao determinar
ser um direito do dono de escravas possuí-las sexualmente, ao descrever que o
próprio Profeta Moisés manteve relações sexuais com uma menina de apenas nove
anos de idade, ao prescrever a morte aos homossexuais e às mulheres que se
casarem “impuras”, tanto os mandamentos do Corão como a Bíblia são bárbaros nos
dias de hoje.
Os textos sagrados do Velho Testamento judaico-cristão foram
escritos há mais de dois mil anos e o Corão foi redigido no século VI da era
cristã. Há muito tempo, portanto. Eram épocas em que as leis laicas e
religiosas eram, frequentemente, a mesma coisa. Os livros do Velho Testamento,
assim com as surias do Corão, prescreviam
regras de conduta e punições para os que não as seguissem. Muito provavelmente
foram um grande avanço numa época de caos social, e devem ter sido responsáveis
por reduzirem punições ainda mais bárbaras e trazerem alguma unanimidade em
relação ao que era ou não justo. Mas isso foi em outra época e em outro
contexto.
O sequestro das jovens estudantes nigerianas por radicais
islâmicos me fez tentar imaginar as razões que levam alguns, ainda hoje, a acreditar
que estas regras ainda devam ser aplicadas. Do ponto de vista do Corão, os
muçulmanos travam o Jihad, uma guerra
santa, um esforço para submeter os “infiéis”. Sob este aspecto, as meninas
nigerianas seriam prisioneiras de guerra e, ao privá-las de educação, eles
estariam cumprindo os desígnios divinos. Como escravidão, sexo com escravas e
com meninas impúberes são previstos no Corão, tudo se encaixa e se justifica
daquele ponto de vista torto.
Estamos, no entanto, no século XXI. Ao contrário do que
imaginam os pessimistas, a civilização evolui. Hoje as leis das sociedades mais
modernas são mais compassivas para com o ser humano e tolerantes para com as
diferenças; mais protetoras para com os indefesos e menos tolerantes com os que
abusam à força de outros seres humanos. Menos bárbaras, portanto. Não admitem o
trabalho escravo, o sexo não consensual, e não condenam adúlteros nem homossexuais/homoafetivos.
A separação entre estado e religião, outra característica das
sociedades modernas, impede a imposição de leis e princípios religiosos aos que
não professam e não concordam com a religião majoritária.
Diga-se de passagem: neste contexto, não vejo sentido lógico
quando uma designação cristã, nos dias de hoje, condena o homossexualismo
baseado em afirmações da Bíblia. A seguir-se todos os mandamentos bíblicos,
estaríamos apedrejando adúlteros, homossexuais e mulheres (só mulheres, vejam
só!) que não se casem virgens. Haja pedra!
Como o aperfeiçoamento civilizatório certamente ainda não se
completou, fico imaginando que mesmo hoje, muito provavelmente ainda admitimos como
normais práticas que vão se revelar bárbaras ou inadmissíveis daqui a alguns
séculos. Que práticas seriam estas? Vale alguma reflexão.
Existe uma lei maior que qualquer código penal ou texto
sagrado: a lei do amor ao próximo, da tolerância para com as diferenças, da
proteção aos vulneráveis. A civilização, em que pesem alguns retrocessos e períodos
de trevas, avança nessa direção. Eu, pelo menos, assim vejo e acredito.
Enquanto isso, caberia às nações que pertencem à parcela mais esclarecida e
civilizada da grande sociedade humana proteger as vítimas do radicalismo e do obscurantismo
religioso. Mas como fazer isso sem violar a autonomia das outras nações?
Questão difícil, mas que exige reflexão e resposta.
Assista este vídeo, um menino egípcio surpreendentemente lúcido.
Assista este vídeo, um menino egípcio surpreendentemente lúcido.
* Alcorão,
Sura 2:228
** Alcorão, Sura 4:24
*** Bíblia,
Deuteronômio 22:22
****Bíblia,
Deuteronômio 22:13-21